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    A Casa da Vovó

    Por Marcelo Godoy
    Existem 15 citações disponíveis para A Casa da Vovó

    Sobre

    Este é um trabalho único, daqueles livros obrigatórios que de tempos em tempos ajudam a entender melhor as agruras do país em que vivemos.
    O jornalista Marcelo Godoy, que construiu nos últimos 25 anos uma respeitadíssima reputação nas redações de grandes publicações, dedicou-se por uma década à mais ingrata das tarefas da profissão: fazer falar quem passou a vida se escondendo.
    Godoy ouviu alguns dos mais ativos agentes da repressão da ditadura militar para contar a história do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) de São Paulo. Criado a partir de uma operação semiclandestina instituída pelo governo, a Oban (Operação Bandeirantes), o DOI-Codi se transformou rapidamente, no início dos anos 1970, no instrumento do regime de exceção para combater as organizações de esquerda.
    Inicialmente, o alvo foi os grupos que optaram pela luta armada. A doutrina do combate à guerra revolucionária mobilizava os militares no Ocidente do pós-guerra, somada a elementos apreendidos da experiência francesa na Argélia, inspirou a criação do órgão que juntou policiais civis ligados ao Esquadrão da Morte com militares que viam, como primeiro objetivo, eliminar os inimigos.
    Essa lógica de investigação policial aliada a práticas e hierarquias militares resultou numa máquina de tortura e morte que ultrapassou qualquer limite de humanidade.
    Além de mais de duas dezenas de entrevistas com homens ? e mulheres ? que defendiam o regime, Godoy também realizou uma dedicada leitura dos principais livros e teses acadêmicas sobre a repressão, o que lhe permitiu compreender, como nunca havia sido feito, documentos inéditos que mostram as engrenagens do DOI-Codi paulista e sua articulação com o sistema de informação e repressão da ditadura.
    O aniquilamento de grupos guerrilheiros como Molipo e ALN encontra, neste livro, sua mais completa e detalhada descrição. Alguns dos crimes mais violentos da repressão também são elucidados.
    Ou seja, este livro é imprescindível para que o país se reencontre com sua história e memória.
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    Citações de A Casa da Vovó

    É sabido que a assimetria em um conflito deslegitima os atos bélicos do lado mais forte, igualando as decisões dos governantes a crimes.

    Matar preso sob custódia, encenar suicídio e torturar opositores não eram novidades no Brasil.

    Concorde-se ou não com a predominância do caráter bélico sobre o político, estabelecer que houve no país um episódio de uma guerra não significa mitigar a violência. Torturar ou executar inimigos quando se pode capturá-los são crimes também na guerra.

    A tática policial estava a serviço de uma estratégia militar. O padrão de comportamento dos agentes nos tiroteios não era a de quem age em legítima defesa, mas a do militar em guerra, a quem é permitido matar em emboscada, atirar pelas costas, enfim, condutas que poderiam levar um policial à prisão. A identificação do criminoso e a punição do crime se tornam secundárias.

    “os que desafiam as plausibilidades, os portadores de más-notícias, que insistem em contar as coisas como elas são” nunca foram bem-vindos e, frequentemente, não são nem mesmo tolerados. “Se é da natureza das aparências esconder suas causas mais profundas, é da natureza da especulação sobre essas causas ocultas encobrir e nos fazer esquecer a brutalidade nua e crua dos fatos, das coisas como elas são.”

    Integrantes de grupos de esquerda cometeram atos terroristas, crimes e erros, mas isso não serve de justificativa aos

    “As direitas liberais tendem a reduzir a democracia, quando a toleram, ao exercício do voto, depositado nas urnas em períodos determinados”. Privilegiam a liberdade econômica, vendo qualquer interferência ou restrição dela como “antidemocrática”. Ela relaciona-se “com os valores democráticos de modo instrumental, sempre envolvida em manobras golpistas… para salvar a democracia, é claro”.58 A direita liberal queria, sobretudo, ordem.

    Os militares dizem que se viram obrigados a atuar pela presença da guerrilha. Mas não foi assim, porque os golpes militares foram anteriores à guerrilha. Os métodos tampouco foram os mesmos: os desaparecimentos, os fuzilamentos de prisioneiros, a tortura em todas as suas variantes e o roubo de crianças foi algo que nem Hitler se animou a fazer. A guerrilha nunca cometeu esses atos.59

    Tinha um capitão que se chamava Maurício, onde ele ia, nos aparelhos, ele roubava. E tinha “polícia” sem-vergonha… o “polícia” safado ia na frente, passava a mão e dizia que era ele [o capitão]…, mas ele [o capitão] roubava também.37 Essas ações, no entanto, são explicadas ainda como um ato normal durante uma guerra: Não tinha corrupção lá. Você falou do negócio de saquear aparelho. Você sabe o que é butim? Num aparelho, normalmente, o que tinha lá dentro era roubado, já havia sido expropriado. Era máquina de escrever, mesa, esse tipo de coisa que tinha utilidade no DOI, pois lá se lutava também com falta de material […]. Agora, quando o agente pegava um sapato ou uma blusa, ele ficava com eles.38

    Em 1970, por exemplo, quando o Dops ainda mantinha um “lugar ao sol” na repressão, a equipe de Fleury quebrou as costelas de um prisioneiro para impedir que os militares pudessem interrogá-lo.3

    O Fleury pegava um tambor desses grandes e punha o defunto lá e depois jogava cimento. Depois jogava o inimigo, o tambor no rio. Eles chamavam isso de boate tchibum, ia levar pra lá. Era na Castelo, onde o Tietê passava. A turma do Fleury jogava. Não era a turma da Casa da Vovó, não. A Casa da Vovó devia ir um pouco mais longe. Iam lá pra onze e meia, meia-noite levar, levar as coisas, desovar. O Marival não inventou isso de jogar no Rio. Só que o Fleury tinha um local e eles [o DOI] tinham um local um pouco mais longe.11

    O modo como eles desfaziam-se dos corpos em Itapevi é semelhante ao usado pelo Centro de Informações do Exército (CIE) na Casa da Morte, em Petrópolis, entre 1971 e 1974, segundo o depoimento do coronel Paulo Malhães à Comissão Nacional da Verdade.8 Lá os corpos eram também cortados, com o sumiço de digitais e destruição da arcada dentária antes de terem a barriga aberta e as partes amarradas a pedras antes de serem jogados em rios da região serrana do Rio. Malhães eras amigo de Ustra e trabalhara na Casa da Morte com o capitão Freddie Perdigão,9 que depois foi transferido para São Paulo.

    Ney presenciou a prisão que, oficialmente – a exemplo dos outros dirigentes comunistas –, nunca aconteceu. Passara a noite e a madrugada à espera do alvo, acompanhando tudo pelo rádio. Com ele, estava um de seus homens de confiança, o agente Pedro Aldeia. Este último entrou no apartamento e recolheu os dólares e os marcos vindos da União Soviética, que foram levados à direção do DOI. Ali teriam sido divididos entre oficiais do DOI, como nas partilhas feitas por quadrilheiros após um roubo.55

    E assim a Casa da Vovó voltaria a golpear o partidão. Ela atuaria de forma clandestina até na área do 1º Exército, deixando de usar o aparelho de Petrópolis para matar, esquartejar e desfazer-se dos corpos. O ritual se realizaria só em São Paulo. Primeiro em Itapevi e, depois, em um sítio perto da Rodovia Castelo Branco. Os corpos eram seccionados e suas partes amarradas em mourões de cercas para que não viessem à tona. Transportadas no porta-malas dos carros da Investigação, as vítimas eram jogadas do alto de duas pontes em um rio da região de Avaré. O comboio para fazer a desova normalmente incluía de dois a três carros. Uma vez, ele foi parado pela Polícia Rodoviária Estadual. O guarda pediu documentos. Foi informado por um oficial do Exército que se tratava de uma operação militar. Não desconfiou de que no bagageiro de um dos veículos estava o cadáver despedaçado de um comunista. Trinta

    Na Presidência do país entrava o general Ernesto Geisel e saía o general Garrastazu Médici. Ambos não só tinham conhecimento como aprovaram muito do que se passou no combate à repressão. Prova disso é a conversa entre os generais Dale Coutinho e Ernesto Geisel, revelada pelo jornalista Elio Gaspari. Recém-convidado pelo novo presidente para ocupar o Ministério do Exército, Coutinho disse a Geisel: “E eu fui pra São Paulo logo em 69, o que eu vi naquela época para hoje… Ah, o negócio melhorou muito. Agora, melhorou, aqui entre nós, foi quando nós começamos a matar. Começamos a matar”. A

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