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    A Correspondência de Fradique Mendes

    Por Eça de Queiroz
    Existem 8 citações disponíveis para A Correspondência de Fradique Mendes

    Sobre



    A modernidade e o estilo de A correspondência de Fradique Mendes são um marco da literatura portuguesa. Eça de Queiroz criou um personagem fascinante, deu-lhe uma pátria, uma família, gostos, profissão e estilo próprio para criar uma voz diferente da sua ? que fizesse um juízo sobre o mundo e sobre a sociedade portuguesa.

    A correspondência de Fradique Mendes é dividida em duas partes: "Memórias e notas" e "As cartas". Na primeira, o autor traça um saboroso perfil biográfico de Fradique. Nesta obra de humor clássico e refinado emerge um Fradique de caráter enigmático, aristocrata, poliglota e intelectual, símbolo de uma geração de pensadores da qual o próprio Eça participou. Já "As cartas", publicadas inicialmente no jornal Repórter de Lisboa e na Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, são um retrato notável da época. Discutem desde grandes questões da humanidade até detalhes pessoais. Apesar de ver a vida como uma "escura debandada para a morte", Fradique acreditava que era possível debandar com arte, graça, estilo e, acima de tudo, bom humor.
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    Citações de A Correspondência de Fradique Mendes

    esse ar de imperturbada e indomável força;

    A sua primeira educação fora singularmente emaranhada: o capelão de D. Angelina, antigo frade beneditino, ensinou-lhe o latim, a doutrina, o horror à maçonaria, e outros princípios sólidos; depois um coronel francês, duro jacobino que se batera em 1830 na barricada de Saint-Merry, veio abalar estes alicerces espirituais fazendo traduzir ao rapaz a Pucelle de Voltaire e a Declaração dos Direitos do Homem; e finalmente um alemão, que ajudava D. Angelina a enfardelar Klopstock na vernaculidade de Filinto Elísio, e se dizia parente de Emanuel Kant, completou a confusão iniciando Carlos, ainda antes de lhe nascer o buço, na Crítica da Razão Pura e na heterodoxia metafísica dos professores de Tubingen. Felizmente Carlos já então gastava longos dias a cavalo pelos campos, com a sua matilha de galgos: – e da anemia que lhe teriam causado as abstrações do raciocínio, salvou-o o sopro fresco dos montados e a natural pureza dos regatos em que bebia.

    apagado de ideias e de modos – mas que despertava e se iluminava todo quando lograva «a chance (como ele dizia) de roçar por um homem célebre, ou de arranchar numa coisa original»; e isto tornara-o a ele, pouco a pouco, quase original e quase célebre.

    As irresistíveis correntes de ideias, de sentimentos, de interesses, trabalham por baixo dele, em torno dele: e parecendo dirigi-las, pelo muito que braceja e ronca de alto, é na realidade por elas arrastado. Assim um omnipotente do tipo Bismarck vai por vezes em aparência no cimo das grandes coisas; – mas como a boia solta vai no cimo da torrente. Miserável omnipotência! E o sentimento desta miséria não pode deixar de influenciar a fisionomia dos nossos poderosos dando-lhe esse feitio contrafeito, crispado, torturado, azedado e sobretudo amolgado que se nota na cara de Napoleão, do Czar, de Bismarck, de todos os que reúnem a maior soma de poder contemporâneo – o feitio amolgado de uma coisa que rola aos encontrões, batendo contra muralhas.

    Alguns anos passaram. Trabalhei, viajei. Melhor fui conhecendo os homens e a realidade das coisas, perdi a idolatria da Forma, não tomei a ler Baudelaire.

    saíra do Quartier Latin a começar uma existência soberba e fogosa. Com um ímpeto de ave solta, viajara logo por todo o mundo, a todos os sopros do vento, desde Chicago até Jerusalém, desde a Islândia até ao Sara. Nestas jornadas, sempre empreendidas por uma solicitação da inteligência ou por ânsia de emoções, achara-se envolvido em feitos históricos e tratara altas personalidades do século.

    agora apaziguado e tratável, ele derrama uma doçura, uma pacificação que penetra na alma, a torna também pacífica e doce, e cria esse momento raro em que céu e alma fraternizam e se entendem.

    Até para manter em estabilidade e solidez a ordem de uma nação, não há mais prestadio cidadão do que este Pinho, com a sua placidez de hábitos, o seu fácil assentimento a todos os feitios da coisa pública, a sua conta do banco verificada às sextas-feiras, os seus prazeres colhidos em higiénico recato, a sua reticência, a sua inércia. De um Pinho nunca pode sair ideia ou ato, afirmação ou negação, que desmanche a paz do Estado. Assim gordo e quieto, colado sobre o organismo social, não concorrendo para o seu movimento, mas não o contrariando também, Pinho apresenta todos os carateres de uma excrescência sebácea. Socialmente, Pinho é um lobinho. Ora nada mais inofensivo que um lobinho: e nos nossos tempos, em que o Estado está cheio de elementos mórbidos, que o parasitam, o sugam, o infecionam e o sobre-excitam, esta inofensibilidade de Pinho pode mesmo (em relação aos interesses da ordem) ser considerada como qualidade meritória.

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