Dizer que Biro-Biro era uma criança normal sem levar em conta o que o senso comum entende por normalidade seria faltar com a verdade, propriamente dita, e maldita. Todos à sua volta estavam convencidos de que ele era mais um caso de agudo retardamento mental. O que hoje pode assumir os tons de um preconceito ignorante, naquele tempo era o diagnóstico natural que se fazia de um menino que, aos onze anos de idade, cruzava as ruas e avenidas pilotando um ônibus imaginário. Na verdade, o ônibus era feito de um longo pedaço de barbante amarrado nas pontas. Biro-Biro ia à frente, pilotando. Uma criança que fazia as vezes de cobrador ia atrás, dando sustentação à estrutura feita apenas de barbante que compunha o coletivo, e os passageiros que chegavam iam se acomodando no meio, segurando o barbante de cada lado, formando um retângulo. Nosso herói conduzia o veículo com todo o cuidado, cioso das regras de trânsito. Se houvesse passageiros no ponto do ônibus, ligava a seta, dando-se ao trabalho de fazer com a boca o barulhinho característico da seta ligada, dava uma rápida olhada no espelho retrovisor imaginário e, certificando-se de que tal manobra não traria riscos para as pessoas que esperavam o ônibus, nem para os seus passageiros, encostava. Só então abria a porta. Se soubesse falar, diria: bom dia.
Assim tem início a saga de Biro-Biro, uma criança retardada à frente de seu tempo.
Este conto integra a coletânea CRIATURAS DEMASIADAMENTE HUMANAS
Assim tem início a saga de Biro-Biro, uma criança retardada à frente de seu tempo.
Este conto integra a coletânea CRIATURAS DEMASIADAMENTE HUMANAS