Caixa-preta
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Talvez o momento mais decisivo daquele domingo tenha sido aquele em que o jogo foi interrompido, assanhando os locutores de rádio, fazendo com que se esquecessem da obrigação de informar, a cada dez minutos, o nome e a localização de suas emissoras. Se tivessem cumprido a lei — permitindo assim que Garcez, em sua escuta desesperada, encontrasse um rumo na escuridão —, o acidente poderia não ter ocorrido.
Se fosse dotado de um radar de aproximação, o Centro teria percebido que o RG-254 não se encontrava na área. Mas Belém não dispunha desse equipamento.
Garcez parou em 270, que lhe pareceu corresponder ao número 0270 indicado no plano de voo. O instrumento comportava três dígitos. No plano de voo, constavam quatro. Garcez ignorou o primeiro dígito (talvez por ser um zero à esquerda) e julgou que 0270 era 270º. Não se lembrou que, no plano de voo, o último algarismo à direita correspondia a décimo de grau; 0270 na verdade significava 27,0º.
Quando regressou da inspeção externa, Zille, em vez de consultar seu próprio plano de voo, ou as cartas de rota, como era de sua obrigação, limitou-se a dar uma olhada no HSI do comandante, onde a proa inserida era 270º.
Quinze entre 22 comandantes internacionais, testados em Amsterdã, cometeram o mesmo equívoco.
Entretanto, assim que chegou ao Galeão, foi dar uma conferida na Varig. Constatou que havia lugares vagos na primeira (o senador José Sarney, que pretendera embarcar com a mulher para Paris, desistira de viajar naquela noite).
“Nós não pedimos para ser eternos, mas apenas para não ver os atos e as coisas perderem subitamente o seu sentido.” Antoine de Saint-Exupéry Voo Noturno
Durante os quase três anos em que trabalhei neste projeto, meu escritório transformou-se numa cabine de comando de um jato de passageiros, ora em chamas sobre Paris, ora com um louco armado a bordo, ora perdido — e com o combustível se esgotando — na escuridão da noite amazônica. Houve momentos em que me senti como se tivesse voltado ao passado e comprado passagens para os voos RG-820, VP-375 e RG-254, cujas histórias (e tragédias) o leitor conhecerá ao desvendar os segredos da caixa-preta que se segue.