?Caiu num silêncio sombrio e obstinado, lançando à irmã olhares furtivos e medrosos. Ela, por sua vez, sentia uma angústia nascente. Inquietava-se, prevendo que aquele encontro lhe faria mal.
? Vês? ? falou Claudio numa voz sumida. ? Ainda agora não sofria e agora sofro.
Continuou, sem olhar para a irmã:
? Às vezes, penso que vou ficar louco.
Tinha na boca uma prega de ferocidade. Mas ? coisa estranha ? a hipótese da loucura, longe de apavorá-lo, deleitava-o inexplicavelmente.?
Nós precisávamos continuar esta história.
Em 1937, Nelson Rodrigues publicou no jornal O Globo o primeiro capítulo de sua novela Cidade. Sob o título ?O Irmão...?, o início desse projeto editorial era tecnicamente completo, com personagens bem-desenhados e uma trama instigante apresentada ao leitor. No entanto, a novela nunca foi terminada.
Acreditando na qualidade do material, a Editora Nova Fronteira convocou quatro destaques da nossa literatura para dar continuidade ao que Nelson começou em 1937. Assim, de capítulo em capítulo, André Sant?Anna, Carlito Azevedo, Aldir Blanc e Veronica Stigger conduziram a história concebida por Nelson, prestando tributos à obra do mestre, mas também deixando suas marcas.
O arremate de Cidade é um grande exercício da própria Nova Fronteira. Em esforço conjunto, os editores amarraram os textos de maneira surpreendente, vibrante, emocional. Não à toa, o último capítulo tem a assinatura de Suzana Flag ? o pseudônimo feminino mais marcante de Nelson. Mais do que uma solução engenhosa para terminar a história de um dos ícones de seu catálogo, mimetizar Suzana Flag é um agradecimento formal ao legado de um homem que viveu para e pela palavra.