O homem eterno: 1 (Clássicos)
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Ora, a melhor relação com a nossa casa espiritual é ficar suficientemente perto para amá-la. Mas a segunda melhor relação é ficar suficientemente longe para não odiá-la.
Quero dizer que em certo sentido vemos os acontecimentos de modo imparcial quando os vemos pela primeira vez.
Os macacos não começaram quadros e os homens os terminaram;
Não conseguem ser cristãos e não conseguem deixar de ser anticristãos. Toda a atmosfera é de reação: azedume, perversidade, crítica barata. Essa gente ainda vive na sombra da fé e perdeu a luz da fé.
Aqueles que gostariam de sugerir que a fé foi um fanatismo estão condenados a uma eterna perplexidade. Na explicação deles, ela deve necessariamente aparecer como fanática por nada e fanática contra quase tudo. Ela é ascética e está em guerra contra os ascetas; é romana e se revolta contra Roma; é monoteísta e luta furiosamente contra o monoteísmo; é severa em sua condenação do que é severo; é um enigma que não se pode explicar nem mesmo como irracionalidade. E que espécie de irracionalidade é essa que parece razoável a milhões de imperadores cultos através de todas as revoluções de aproximadamente mil e seiscentos anos? Ninguém se diverte com um enigma, ou paradoxo, ou uma simples confusão mental durante um espaço de tempo tão longo. Não conheço nenhuma explicação a não ser a que afirma que esse fenômeno não é uma irracionalidade, é razão; que se há fanatismo é fanatismo pela razão e contra o que não é racional. Essa é a única explicação que consigo achar para uma coisa que desde o início é tão desapegada e tão confiante, condenando coisas tão parecidas com ela mesma, recusando ajuda de poderes que pareciam essenciais para sua existência, compartilhando em seu aspecto humano de todas as paixões de sua época, e no entanto sempre, no momento supremo, elevando-se de repente acima delas, nunca dizendo exatamente o que se esperava que ela dissesse e nunca precisando desdizer o que havia dito. Não consigo encontrar nenhuma explicação exceto a de que, como Palas saiu do cérebro de Júpiter, ela de fato saiu da mente de Deus, madura e poderosa e armada para o julgamento e para a guerra.
É preciso dizer às claras que toda essa ignorância é simplesmente encoberta pela desfaçatez. Fazem-se afirmações com tanta simplicidade e certeza que quase ninguém tem a coragem moral de as ponderar e descobrir que elas não se sustentam. No outro dia um resumo científico sobre o estado de uma tribo pré-histórica começava com estas confiantes palavras: “Eles não usam roupas”. É provável que nenhum dentre cem leitores tenha parado para perguntar-se como poderíamos saber se roupas foram outrora usadas por gente de quem nada restou a não ser alguns fragmentos de ossos e pedras. Esperava-se sem dúvida que, assim como se encontrou um machadinho de pedra, deveríamos encontrar um chapéu de pedra. Fica evidente que se antecipou que poderíamos descobrir um indestrutível par de calças da mesma substância da indestrutível rocha. Mas aos olhos de alguém com um temperamento menos confiante parecerá óbvio que as pessoas poderiam usar roupas simples, ou até mesmo roupas muito ornamentais, sem delas deixar mais vestígios do que deixaram de outras coisas. O entrelaçamento de juncos e capim, por exemplo, poderia ter-se sofisticado cada vez mais sem se tornar minimamente mais duradouro. Uma civilização poderia especializar-se em atividades que por acaso eram perecíveis, como tecer e bordar, em vez de atividades que por acaso eram mais permanentes, como a arquitetura e a escultura. São abundantes os exemplos dessas sociedades especializadas. Alguém que no futuro descobrisse as ruínas de nossas máquinas industriais poderia de modo igualmente justo dizer que nós só conhecíamos o ferro e nenhuma outra substância, anunciando a descoberta de que o proprietário e gerente da indústria sem dúvida nenhuma caminhava por aí nu — ou talvez usasse calças e chapéus de ferro.
Outro exemplo poderíamos encontrar não no problema do mal, mas naquilo que é chamado de problema do progresso. Um dos mais argutos agnósticos de nossa época perguntou-me certa vez se eu achava que a humanidade estava ficando melhor ou pior, ou se continuava a mesma. Ele estava seguro de que a alternativa cobria todas as possibilidades. Não percebia que ela só cobria modelos e não quadros, processos e não histórias. Eu lhe perguntei se ele achava que o sr. Smith de Golder’s Green havia ficado melhor ou pior, ou se havia permanecido exatamente o mesmo entre os trinta e os quarenta. Depois disso pareceu surgir nele a suspeita de que tudo dependeria principalmente do sr. Smith e de como ele escolhera proceder na vida. Nunca lhe ocorrera antes que tudo poderia depender de como a humanidade escolhera proceder; e que seu curso não era uma linha reta ou uma curva ascendente ou descendente, mas sim uma trilha como aquela de um homem que atravessa um vale, indo para onde quisesse e parando onde desejasse, entrando numa igreja ou caindo bêbado numa sarjeta. A vida de um ser humano é uma história: uma história de aventura. Em nossa visão o mesmo se aplica até mesmo à história de Deus.
É a simples verdade que o homem difere dos animais em espécie e não em grau; e a prova disso está aqui: soa como um truísmo dizer que o homem mais primitivo fez o desenho de um macaco, e soa como uma piada dizer que o macaco mais inteligente fez o desenho de um homem. Algo de divisão e proporção apareceu; algo único. A arte é a assinatura do homem.
O homem é o microcosmo; o homem é a medida de todas as coisas; o homem é a imagem de Deus. Essas são as únicas lições verdadeiras a serem aprendidas na caverna, e está na hora de sair dela em busca do espaço aberto.
Quando o mundo vai mal, comprova-se sobretudo que a Igreja está certa. A Igreja se justifica não porque seus filhos não pecam, mas porque pecam.
A superstição ocorre em todas as épocas, e especialmente em épocas racionalistas.