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    O tempo redescoberto

    Por Marcel Proust
    Existem 13 citações disponíveis para O tempo redescoberto

    Sobre

    O Tempo redescoberto, com tradução de Lúcia Miguel Pereira, é o último volume da obra Em busca do tempo perdido, um dos maiores clássicos da literatura mundial. E sendo o último é também o primeiro, o que, à primeira vista, pode parecer estranho. Mas é neste volume que o leitor entenderá perfeitamente quais foram as ideias que nortearam o narrador desde o primeiro volume, No caminho de Swann. É na segunda parte de O tempo redescoberto que tudo se revela, num ritmo narrativo apaixonante.

    O romance foi originalmente dividido em três partes (seguindo edição de 1927 usada pela tradutora Lúcia Miguel Pereira e atualizada para a presente edição com base no texto de 1989). Na primeira, Tansoville, Proust retoma a narração de A fugitiva. O herói se encontra na mansão de Robert e Gilberte Saint-Loup, onde, em seu quarto de hóspede, projeta nas paredes suas reminiscências, como a lembrança do campanário de Combray e a sua relação com Albertine. No convívio da casa, também entra no tema da ?inversão?, como a de seu amigo Robert, que tinha amantes para disfarçar sua relação com o violinista Morel. Esses elementos serão retomados ao longo do romance, principalmente na segunda parte, em O Sr. Charlus durante a guerra; suas opiniões, seus divertimentos.

    Entre as dúvidas pessoais mais profundas do narrador está a dos seus ?dons literários?. Diante do enxame de lembranças, ele se pega pensando na sua própria falta de talento em poder fixar todos os seus pensamentos numa obra literária. Tema que será tratado, e revelado, na última parte do livro. Antes, porém, ele ainda explora a figura de Charlus, tio de Robert, um velho e alquebrado homem, cujos desejos intensos o levam a frequentar uma espécie de ?inferninho?, durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A velha nobreza e sua perversão sexual mais uma vez é tratada, mas aqui num dos momentos críticos da vida europeia. No tecido que sua narrativa arma, todos os tempos parecem se encontrar ? o íntimo e o histórico ?, ou como ele diz, ao perceber as relações entre situações dispersas na memória, ?as lançadeiras ágeis do tempo tecem fios entre as lembranças que nos parecem a princípio mais independentes?.

    São essas lançadeiras que ele irá perceber, em pleno funcionamento, na bela última parte do romance, A recepção da princesa de Guermantes. No caminho da recepção, enquanto remói suas possibilidades literárias, ele tropeça nas pedras irregulares do calçamento. Esse simples tropeção será um momento de alta epifania. É como se a sua máquina do mundo, enfim, se abrisse: o tropeção despertara sua memória, como a madeleine no chá, lançando-o no sistema sanguíneo do tempo. Como essa, outras situações tiveram a mesma função. Já na sala de espera dos Guermantes, um tilintar de colher o colocou novamente diante do passado. Era, como ele diz, ?um pouco de tempo em estado puro?.

    É desta série de memórias involuntárias, de prazer intenso e de alta revelação, que nasce o projeto de Em busca do tempo perdido. É quando o narrador percebe como fixar a riqueza de sua própria experiência, num caminho que entranha o ser íntimo com o mundo exterior. Essas são, sem dúvida, as mais belas páginas da literatura universal. ?Compreendi que a matéria da obra literária era, afinal, minha vida passada; que tudo me viera nos divertimentos frívolos, na indolência, na ternura, na dor, e eu acumulara como a semente os alimentos de que se nutrirá a planta, sem adivinhar-lhe o destino, nem a sobrevivência?. E é esta planta, com suas mil nervuras, que o leitor encontrou ao longo do conjunto de Em busca do tempo perdido.

    Esta nova edição, inteiramente revista e anotada, traz ainda prefácio e resumo de Guilherme Ignácio da Silva, posfácio de Bernard Brun e um belo ensaio da professora da PUC de São Paulo e crítica literária Leda Tenório da Motta.
    *Texto escrito pot Heitor Ferraz, jornalista, professor e poeta.
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    Citações de O tempo redescoberto

    Na realidade, todo leitor é, quando lê, o leitor de si mesmo. A obra não passa de uma espécie de instrumento óptico oferecido ao leitor a fim de lhe ser possível discernir o que, sem ela, não teria certamente visto em si mesmo.

    Graças à arte, em vez de contemplar um só mundo, o nosso, vemo-lo multiplicar-se, e dispomos de

    A felicidade é salutar para o corpo, mas só a dor enrijece o espírito.

    livros verdadeiros se geram não na diurna luz e nas palestras, mas no escuro e no silêncio.

    Chegara eu assim à conclusão de que não somos de modo algum livres diante da obra de arte, que não a fazemos como queremos, mas que, sendo preexistente, compete-nos, porque é necessária e oculta e porque o faríamos se se tratasse de uma lei da natureza, descobri-la.

    Muitos escritores, em cujo âmago já não aparecem essas verdades misteriosas, só escrevem, a partir de certa idade, com a inteligência, cada vez mais robusta; os livros da maturidade são por isso mais fortes do que os da juventude, porém já não possuem o mesmo aveludado frescor.

    Os desgostos são servos obscuros, detestados, contra os quais lutamos, sob cujo domínio caímos cada vez mais, servos atrozes, insubstituíveis, que por vias subterrâneas nos conduzem à verdade e à morte. Felizes os que deparam a primeira antes da segunda, para quem, embora muito próximas uma da outra, a hora da verdade soa antes da hora da morte.

    A arte de viver consiste em nos sabermos servir de quem nos atormenta como de degraus de acesso à sua forma divina, povoando assim diariamente de deuses nossa vida.

    Nem uma só hora de minha vida deixou de servir para ensinar-me, como já disse, que apenas a percepção grosseira e errônea enfeixa tudo no objeto quando, ao contrário, tudo reside no espírito.

    Tal velha tivera vontade de chorar ao compreender que o indefinível sorriso melancólico, sua maior sedução, já não conseguia irradiar-se pela máscara de gesso que lhe aplicara a velhice.

    E eu afirmo que a lei cruel da arte exige que os seres pereçam, que nós mesmos morramos padecendo todos os tormentos, a fim de que cresça a relva, não do olvido, mas da vida eterna, a dura relva das obras fecundas, sobre a qual as gerações futuras virão alegremente, sem cogitar dos que sob ela dormem, fazer seus piqueniques.

    Depois, deixando-me, caminhou ligeira para a saída, a fim de não incomodar os outros, e também de mostrar-me que só não ficara a palestrar comigo por estar com pressa, devendo recuperar o minuto perdido se quisesse chegar pontualmente ao chá da rainha da Espanha, da qual era a única convidada. Até, perto da porta, pareceu-me que se ia pôr a correr. Corria, com efeito, para o túmulo.

    E, mal me via acompanhado, induzia-me a frivolidade a brilhar, mais desejoso de divertir tagarelando do que de instruir-me escutando,

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