Queda Avessa da Pluma
Esse é um livro de contos surpreendente. Foi escrito na ocasião em que JH Henriques estava em franca concentração de valores e recaía sempre no estilo muito particular, característica maior de sua obra. Os contos são fábula da mais pura qualidade. De uma maneira insólita, trabalham com o absurdo, à forma do que seria um existencialismo fantástico de Gabriel Garcia Marquez. Fragmento do primeiro conto: Pois que surgia a apara clara de uma manhã como havia de ser outra qualquer. O Professor Epotamenides Tanibeu Cenibabo estacou diante do espelho grande da sala de banho e mirou, os olhos atentos à sua imagem. Todavia, a um só tempo estava disperso na visão dos olhos vermelhos. A cada manhã assustava-se com as solapadas visões que via, cada uma se repetindo e nem sempre agradando ao dono delas. O Professor Cenibabo não era mais o mesmo dos tempos em que vislumbrava uma lucidez muito grande na pele, um liso de boa memória. Os fios erectos da barba a despontar, seguros e negros, contra a diversidade da face. Naquele tempo antanho era assim. Se surgia uma brotoeja sobre o claro da pele, o Professor corria a desativá-la com uma loção, um embondo qualquer de natureza alcoólica. Pois que se até mudam os sonhos e as verdades, por que cargas de rapadura sobre um burro, não haveria de estar mudado o perfil de seu mundo e de sua imagem? Nada fica eterno ou simplesmente impune. Confrontos de tempo, embora doloridos de serem enfrentados, soem dar as caras muito simploriamente, diante de um reflexo de espelho, numa manhã ordinária. Era o comum. Ali, diante de sua imagem, o Professor Cenibabo enfrentava o amargo de um novo dia que ia dar alento às andanças, as lentidões de processos, as pastas repletas de crimes e visões conhecidas, falcatruas diversas em um Mundo até que limitado, lengalenga, embargo, desembargo, recorre e aprecia. Despacha e refrega, toureia, calibra, esporeia e desinfeta. Suspira largo e sua. O Professor fazia uso dos verbos todos naquele instante. Corroía a ilusão de cada um nele mesmo. A força de cada empreendimento começado. A fragilidade repetida em cada derrota. Sabia ele que a vida consome muita dificuldade para sair adiante do abrupto mundo. Das demandas enfurnadas em casos enfumaçados. Nem sempre a clareza é mais regalada do que uma confusão. Diante destes subterfúgios de mudez e surdez, o espírito amargando mais e mais, o Professor depunha contra a vida, uns pormenores que nem justificavam o viver, o explicar a aventura quebradiça de levar adiante as cargaderas de uma vida impoluta. De que vale o todo, se o nada é mais enfermiço e estafermo dentro dele do que a própria conjuntura do inteiro? Diante do espelho, na hora que começava a raiar o normal do dia, o Grande Professor Cenibabo confeccionava rumos e destrinçava memórias, sem que mesmo fizesse esforço para que elas surgissem à luz de sua lembrança. Uma vindo sobre a outra, debalde ele querer ater-se somente aos olhões rubros que vingavam na tela do espelho. Sua imagem estando mais pesada e com dores às ilhargas do que mesmo justificava a sua idade, ele nem sendo maior de estar do que além dos quarenta anos sobre a cacunda. De como exemplo, reclamava as dores o seu velho pai, o Desembargador Cenibabo Guimelhões, artrítico consumado depois dos sessenta anos refeitos.
Esse é um livro de contos surpreendente. Foi escrito na ocasião em que JH Henriques estava em franca concentração de valores e recaía sempre no estilo muito particular, característica maior de sua obra. Os contos são fábula da mais pura qualidade. De uma maneira insólita, trabalham com o absurdo, à forma do que seria um existencialismo fantástico de Gabriel Garcia Marquez. Fragmento do primeiro conto: Pois que surgia a apara clara de uma manhã como havia de ser outra qualquer. O Professor Epotamenides Tanibeu Cenibabo estacou diante do espelho grande da sala de banho e mirou, os olhos atentos à sua imagem. Todavia, a um só tempo estava disperso na visão dos olhos vermelhos. A cada manhã assustava-se com as solapadas visões que via, cada uma se repetindo e nem sempre agradando ao dono delas. O Professor Cenibabo não era mais o mesmo dos tempos em que vislumbrava uma lucidez muito grande na pele, um liso de boa memória. Os fios erectos da barba a despontar, seguros e negros, contra a diversidade da face. Naquele tempo antanho era assim. Se surgia uma brotoeja sobre o claro da pele, o Professor corria a desativá-la com uma loção, um embondo qualquer de natureza alcoólica. Pois que se até mudam os sonhos e as verdades, por que cargas de rapadura sobre um burro, não haveria de estar mudado o perfil de seu mundo e de sua imagem? Nada fica eterno ou simplesmente impune. Confrontos de tempo, embora doloridos de serem enfrentados, soem dar as caras muito simploriamente, diante de um reflexo de espelho, numa manhã ordinária. Era o comum. Ali, diante de sua imagem, o Professor Cenibabo enfrentava o amargo de um novo dia que ia dar alento às andanças, as lentidões de processos, as pastas repletas de crimes e visões conhecidas, falcatruas diversas em um Mundo até que limitado, lengalenga, embargo, desembargo, recorre e aprecia. Despacha e refrega, toureia, calibra, esporeia e desinfeta. Suspira largo e sua. O Professor fazia uso dos verbos todos naquele instante. Corroía a ilusão de cada um nele mesmo. A força de cada empreendimento começado. A fragilidade repetida em cada derrota. Sabia ele que a vida consome muita dificuldade para sair adiante do abrupto mundo. Das demandas enfurnadas em casos enfumaçados. Nem sempre a clareza é mais regalada do que uma confusão. Diante destes subterfúgios de mudez e surdez, o espírito amargando mais e mais, o Professor depunha contra a vida, uns pormenores que nem justificavam o viver, o explicar a aventura quebradiça de levar adiante as cargaderas de uma vida impoluta. De que vale o todo, se o nada é mais enfermiço e estafermo dentro dele do que a própria conjuntura do inteiro? Diante do espelho, na hora que começava a raiar o normal do dia, o Grande Professor Cenibabo confeccionava rumos e destrinçava memórias, sem que mesmo fizesse esforço para que elas surgissem à luz de sua lembrança. Uma vindo sobre a outra, debalde ele querer ater-se somente aos olhões rubros que vingavam na tela do espelho. Sua imagem estando mais pesada e com dores às ilhargas do que mesmo justificava a sua idade, ele nem sendo maior de estar do que além dos quarenta anos sobre a cacunda. De como exemplo, reclamava as dores o seu velho pai, o Desembargador Cenibabo Guimelhões, artrítico consumado depois dos sessenta anos refeitos.