Se Pessoa é, como concebeu Eduardo Lourenço, um típico autor moderno, a literatura, conforme concebida por ele, gostaria justamente de ser um espaço livre das contradições da Era Moderna. Os heterônimos (Caeiro, Campos e Reis) talvez ocupem o lugar desse desejo impossível; já o ortônimo (que também é o Pessoa-personagem), assume um papel ambíguo em relação a esse espaço: se por um lado se integra a ele, enquanto ser ficcional, também dá testemunho de seu não-pertencimento a uma realidade que não é a sua, mas a do seu desejo. Assim, dentro e fora, participante e testemunha, ele compartilha conosco suas conclusões ou, melhor ainda, seu espanto, o de um autor perdido em meio a uma literatura – e de um tempo – que tem vida própria e que gira ao seu redor em uma dança na qual ele não tem mais capacidade (terá tido um dia?) de participar.
Vertigens do eu: autoria, alteridade e autobiografia na obra de Fernando Pessoa
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