We love eBooks
    Vida Urbana

    Vida Urbana

    Por Afonso Henriques de Lima Barreto
    Existem 3 citações disponíveis para Vida Urbana Baixar eBook Link atualizado em 2017
    Talvez você seja redirecionado para outro site

    Definido como

    Listados nas coleções

    Citações de Vida Urbana

    O CHEFE POLÍTICO E O SEU ELEITORSeu doutor, eu vim incomodá-lo; mas precisava muito ficar bem com minha consciência.- Que há?- Eu não voto no doutor Rui.170- Como você vai votar no Epitácio?171- Nem num nem noutro.- Você está ficando indisciplinado; não é mais o correligionário disciplinado de antigamente. Que diabo foi isso?- Eu não tenho sido companheiro para você?- Sim senhor. Devo ao doutor todos os obséquios desta vida, pelo que lhe sou muito agradecido. Foi o doutor que abaixo de Deus, salvou a Marocas, minha mulher, sem cobrar nada… Quando foi o enterro do meu filho Dodoca, o doutor me ajudou muito…- Isso tudo não vem ao caso. Falemos…- Não; vem sim, doutor! Quero que o senhor não pense que sou mal agradecido. Se estou empregado, devo ao doutor e…- Se você continuasse no partido, podia subir ou nós arranjávamos uma equiparação ou mesmo um aumento de vencimentos; mas…- Continuo no partido, doutor…- Como? Você não vota conosco…- Mas não voto no outro.- É o mesmo.- Não é doutor.-É sim Felício! Em política, quem não é por mim é contra mim. Você sabe disso não é?- É e não é. Não estou contra o senhor não senhor! É que me deu uma coisa cá dentro e eu…- Que foi que deu em você?- Eu me explico, tanto mais que tenho pensado muito no caso. O senhor quer me ouvir?- Ouço, mas você não demora muito.- Não demoro não senhor.- Conte lá a história.- Vou contar. Trata-se – não é verdade? – de escolher o homem que vai governar isto tudo. Quero dizer que ele vai governar todos os brasileiros, inclusive eu.- Daí?- Espere doutor! Pensei, então, eu cá com os meus botões: vou escolher uma pessoa que deve mandar em mim, na minha mulher, nos meus filhos, na minha casa até – preciso cuidado. Não é doutor?- Mais ou menos, é, pois há a lei que …- Isto de lei é história. Quem governa é ele mesmo…- Vamos adiante.- Um homem que vai ter tanto poder sobre mim, sobre os meus e sobre as minhas coisas para ser escolhido por mim mesmo, deve ser meu conhecido

    OS CORTESNos momentos em que a pátria fica a níqueis, a Câmara e o Senado, isto é, os senhores senadores e os senhores deputados, lembram-se logo de diminuir o número de funcionários públicos.Não digo que se não possa faze-lo; a tal respeito, não tenho opinião.Diminuí-los ou não, mesmo que eu entre no corte, é para mim absolutamente indiferente.Noto, porém, que as duas casas do congresso não se lembram, de forma alguma, do que se passa nelas.Toda a gente sabe que a Câmara e o Senado, têm cada qual uma secretaria, um serviço de redação de debates, uma legião de auxiliares, de contínuos e serventes, e que esse cardume de empregos aumenta de ano para ano. Porque o congresso não começa cortando nas respectivas secretarias, para dar exemplo?Nesse ponto não se toca, não se diz nada e os empregados do executivo são os mais culpados do déficit.É uma verdadeira injustiça, tanto mais que os funcionários da Câmara e do Senado têm, quase sempre, além de bons ordenados legais, consideráveis gratificações, sob este ou aquele pretexto.O povo diz que macaco não olha para o seu rabo; os parlamentares só olham para os dos outros.Não se lembram que, de quando em quando, vão criando lugares nas suas secretarias, absolutamente desnecessários, tão-somente para atender a impulsos de coração.Homo sum…24Certamente os senhores devem saber que, antigamente, os atuais diretores de secretarias eram chamados oficiais-maiores.Pois bem: a Câmara tem na sua secretaria um diretor, um vice-diretor ou dois, e um oficial- maior.Não é fácil mostrar assim o rol de empregados em duplicata ou triplicata que há por lá. Os regulamentos não falam claro; é preciso combiná-los com indicações, com autorizações camarárias e é trabalho que sempre reputei e reputo enfadonho.O Diário Oficial foi feito para não ser lido e o congresso não tem mais direitos a melhores atenções.A observação ai fica, e, enquanto ela quiser imitar qualquer das famosas “secretarias da comissão tal” legisladores extra

    A LEIEste caso da parteira merece sérias reflexões que tendem a interrogar sobre a serventia da lei.Uma senhora, separada do marido, muito naturalmente quer conservar em sua companhia a filha; e muito naturalmente também não quer viver isolada e cede, por isto ou aquilo, a uma inclinação amorosa.O caso se complica com uma gravidez e para que a lei, baseada em uma moral que já se findou, não lhe tire a filha, procura uma conhecida, sua amiga, a fim de provocar um aborto de forma a não se comprometer.Vê-se bem que na intromissão da “curiosa” não houve nenhuma espécie de interesse subalterno, não foi questão de dinheiro. O que houve foi simplesmente camaradagem, amizade, vontade de servir a uma amiga, de livrá-la de uma terrível situação.Aos olhos de todos, é um ato digno, porque, mais do que o amor, a amizade se impõe.Acontece que a sua intervenção foi desastrosa e lá vem a lei, os regulamentos, a polícia, os inquéritos, os peritos, a faculdade e berram: você é uma criminosa! você quis impedir que nascesse mais um homem para aborrecer-se com a vida!Berram e levam a pobre mulher para os autos, para a justiça, para a chicana, para os depoimentos, para essa via-sacra da justiça, que talvez o próprio Cristo não percorresse com resignação.A parteira, mulher humilde, temerosa das leis, que não conhecia, amedrontada com a prisão, onde nunca esperava parar, mata-se.Reflitamos, agora; não é estúpida a lei que, para proteger uma vida provável, sacrifica duas? Sim, duas porque a outra procurou a morte para que a lei não lhe tirasse a filha. De que vale a lei?Correio da Noite, Rio, 7-1-1915.

    eBooks por Afonso Henriques de Lima Barreto

    Página do autor

    Relacionados com esse eBook

    Navegar por coleções eBooks similares